Esmaltes engordam?
Talvez pelo nome você não o conheça, mas o fosfato de trifenila (Triphenyl Phosphate) é um componente importante nos esmaltes, pois ele confere flexibilidade ao filme e faz com que o produto não entre em combustão facilmente, uma vez que os esmaltes possuem uma grande quantidade de solventes em sua composição.
Saiba mais sobre a composição de um esmalte: Anatomia dos Cosméticos – Esmalte
Uma de nossas leitoras (a querida Luana Abreu) nos enviou um post que falava que estudos mostravam que o fosfato de trifenila poderia afetar o sistema endócrino (responsável pelos hormônios, metabolismo, reprodução e desenvolvimento) e que devido ao componente ser uma neurotoxina, substância altamente tóxica que pode prejudicar o cérebro e também poderia causar desequilíbrio hormonal e, assim, ser o responsável pelo aumento de peso.
Nos sites que busquei por essa informação sempre se lia “estudos”, pouquíssimos mencionavam a Duke University e o Environmental Working Group – EWG (onde são os autores) e quase ninguém o nome dos pesquisadores, mas consegui achar através do site Centro Nacional de Biotecnologia americano o resumo do artigo, que foi publicado em 2015, mesmo assim eu acho importante nesses casos sempre mencionar a pesquisa, de onde foi, quem fez etc, pois dessa maneira quem tiver interesse procura mais profundamente para entender mais sobre o assunto.
O que é o TPhP e quais são seus efeitos
O fosfato de trifenila (TPhP) é um componente químico usado em plásticos para melhorar a flexibilidade e como retardador de chama.
Retardador de chama é uma substância química utilizada com o intuito de retardar ou, se possível, eliminar a propagação de chamas em um material.
Vários estudos realizado em animais e em in vitro sugerem que ele poderia ser um desregulador endócrino que afeta os hormônios – em particular, poderiam afetar a saúde reprodutiva e no metabolismo lipídico (é de onde o “o esmalte de unha pode fazer engordar” vem). Estudos epidemiológicos em seres humanos também encontraram correlações entre TPhP e diminuição na contagem de esperma. No entanto, tudo isso está longe de ser evidências conclusivas, e se você acessou a internet nos últimos anos, provavelmente se deparou com algum componente químico esta relacionado a desregulação endócrina (esse no caso só seria o vilão da vez).
Ao ser absorvido pelo corpo o fosfato de trifenila (TPhP) é rapidamente metabolizado e transformado em fosfato de difenila (DPhP) e eliminado na urina após 24 horas.
Como foi realizado o estudo
O artigo relata dois painéis principais, com um esmalte contendo 0,97% em peso fosfato de trifenila.
O painel 1 foi realizado da seguinte maneira:
- 16 estudantes do sexo feminino sem qualquer esmalte de unha 72 horas antes usando o experimento.
- Em seguida, foi coletada uma amostra de urina de cada participante (T1).
- 24 horas depois, as participantes do painel pintaram as unhas com duas camadas de esmalte.
- 2 – 6 horas depois, recolheram outra amostra de urina Recolheram (T2).
- 10-14 horas mais tarde, uma terceira amostra de urina foi coletada (T3).
O painel 2 foi realizado da seguinte maneira:
- 10 mulheres que estavam sem usar esmalte a 72 antes da realização do experimento;
- Toda a urina foi recolhida no estudo, durante 24 horas (6 pessoas) ou 48 horas (4) painelistas;
- As participantes do teste da urina de 24 horas, não usaram esmalte (Controle);
As pessoas foram divididas em dois grupos:
- Metade pintaram as unhas com com 2 demãos esmalte;
- A outra metade, pintaram as unhas sob as luvas de latex e após uma hora descartaram as mesmas.
- Após 7 dias, os grupos foram trocados (o que é conhecido como estudo clínico randomizado)
O estudo clínico randomizado (ECR) é uma das ferramentas mais poderosas para a obtenção de evidências para o cuidado à saúde. Apesar de algumas possíveis variações, baseiam-se na compara- ção entre duas ou mais intervenções, as quais são controladas pelos pesquisadores e aplicadas de forma aleatória em um grupo de participantes.
- As amostras de urina foram analizadas qual o teor de fosfato de difenila tinha presente, e para ter em conta os efeitos da diluição (costumes pessoas de ingestão de líquidos), as amostras de urina foram corrigidos para a gravidade específica (SG).
O resultado mostrou que entre 10 – 14 horas houve um aumento da concentração do fosfato de difenila (DPhP) 7 vezes mais do que no momento zero.
Usar esmalte aumenta a concentração de TPhP no corpo?
Em termos de concentração, sim, nos dois painéis – para citar o estudo, “esmalte é uma provável fonte de absorção de TPhP e que o uso pode resultar em absorção substancialmente maior do que o placebo.”
Placebo é preparação neutra quanto a efeitos farmacológicos, ministrada em substituição de um medicamento/produto, com a finalidade de controle.
Notou-se que a concentração do DPhP só estava presente em que pintou as unhas e não em que inalou (Painel 2).
Esses valores são suficientes para afetar a saúde?
Então…apesar de ter tudo um resultado maior ainda ele é inconclusivo, porque os valores são muito baixos, coisa de milionésimo de grama. Mesmo tendo uma multiplicação ainda continua sendo muito pequena.
Pense da seguinte forma: Se a pessoa pintar a unha uma vez por semana, ao todo terá usado 0,3g do esmalte e se nesse esmalte tiver 1% de fosfato de trifenila (TPhP) isso significa haverá presente 0,003gramas do componente em cada aplicação.
Nos estudos realizados em animais que mostraram os efeitos adversos do fosfato de trifenila, as quantidades aplicadas foram muito maiores e a forma de absorção foi muito mais radical. Os ratos foram alimentados com ração diariamente, os peixes nadaram por dias em uma mistura de água e fosfato de trifenila e nos gatos (sim testaram em gatos) foi injetado entre 0,2 – 0,4% de TPhP durante duas semanas.
A solução é nunca mais pintar as unhas?
De acordo com a pesquisa eu acho que não, até que se apresente uma evidência concreta que essas quantidades tão baixas possam alterar a saúde de forma tão significativa, sinceramente da forma em que a grande mídia trata desse artigo é alarmismo.
O esmalte não é a única fonte de fosfato de trifenila que estamos expostos, ele está presente na vida de quase todas as pessoas do mundo, pois ele está presente nos componentes eletrônicos, plásticos, fluídos hidraulicos, canos de PVC, tintas, colas e resinas de fundição. Por isso, mesmo que se abra mão de esmaltes com fosfato de trifenila, não haverá garantias que a pessoa estará livre 100% de estar absorvendo o componente. (Não se esqueça que o fosfato de trifenila se transforma em fosfato de difenila ao ser metabolizado pelo corpo).
É importante mencionar que o estudo não foi reproduzido, e os universo estatístico foi muito pequeno (26 pessoas) e isso não trás nenhuma evidência concreta que os fosfato de trifenila presente nos esmaltes cause algum problema significativo.
Os estudos realizados em animais que mostram os efeitos adversos do fosfato de trifenila, as quantidades aplicadas foram muito maiores e a forma de absorção foi muito mais radical. Os ratos foram alimentados com ração diariamente, e os peixes nadaram por dias em uma mistura de água e fosfato de trifenila.
Outro ponto importante é que o componente é rapidamente metabolizado e excretado do corpo.
Em geral, as unhas não são muito permeáveis aos produtos químicos. Os pesquisadores relatam que eles não tem certeza de como o fosfato de trifenila foi absorvido, se foi através do sangue, se foi pelas unhas ou se pelas cutículas.
E falando francamente, mesmo se a pessoa parar de usar esmaltes com fosfato de trifenila, isso não garantirá uma melhora na saúde e qualidade de vida de forma significativa.
Eu quero pontuar que não sou da área de saúde, nem toxicologista e não fui a melhor estudante de estatística, mas o resultados não soaram nada tão alarmantes como propagaram nas redes sociais, mas estou a disposição para ser corrigida caso apareçam falhas na minha interpretação.
Outras substâncias neurotóxicas que usamos
Acredito que o fundamental são as quantidades aplicadas, por exemplo usamos a toxina botulínica, um conhecidíssimo produto para atenuação de rugas, mas se estiver um grande quantidade ela poderá paralisar o corpo, por se uma neurotoxina. Além disso, não existem dados suficientes sobre os efeitos da TPhP em seres humanos para dizer nada conclusivo.
Mais uma vez mencionando o artigo:
“São necessárias maiores pesquisas para determinar se os níveis de exposição do TPhP presentes nos esmaltes, podem realmente causar um risco para a saúde humana.”
Artigo Original: E Mendelsohn, A Hagopian, K Hoffman, CM Butt, A Lorenzo, J Congleton, TF Webster and HM Stapleton, Nail polish as a source of exposure to triphenyl phosphate, Environmental International 2016, 86, 45-51.