Momento Terapia: Como a psicologia explica a fantasia?

Nesta semana, quero aproveitar o agito causado pelas festas do Halloween, e falar um pouco sobre o papel da fantasia na nossa vida, não a fantasia que muitos usarão para ir as tais festas, mas a fantasia no sentido psicológico, que pode contribuir positiva ou negativamente para a nossa saúde emocional.

Como a psicologia explica a fantasia?

Bom, essa é questão bastante complexa, mas que vou tentar simplificar.

A fantasia é criada pelo inconsciente como garantia de satisfação de desejos sobre algo que não é possível à realização. Dito de outra forma, a pessoa busca através da fantasia, realizar desejos que não podem ser concretizados na sua vida real.

Isso não é ruim, pois pode ajudá-la a resolver conflitos, minimizar angustia, proporcionar sensação de bem-estar etc. É um mecanismo natural ao psiquismo de todos nós. Torna-se prejudicial quando a pessoa “substitui” a realidade pela fantasia, passa a buscar suas satisfações e recompensas no mundo imaginário e deixa de atuar na sua realidade prática (vida real).

A fantasia é identificada prontamente nas brincadeiras infantis e ela contribui bastante para o desenvolvimento psíquico e emocional dos pequenos, por isso deve ser valorizada pelos adultos, nada de tratar com desdém, ao contrário, a criança que fantasia consegue expressar a riqueza do seu mundo interno, desenvolve mecanismos que a permite simbolizar situações e sentimentos. E isso certamente contribuirá para o seu amadurecimento e para a sua saúde emocional na vida adulta.

Existem muitas obras e estudos psicológicos que apontam a contribuição dos Contos de Fadas para o desenvolvimento emocional das crianças. Não à toa, a indústria do entretenimento (cinema, livros, TV) se aproveita disso e oferece-nos uma infinita variedade de filmes e conteúdos. Uma maravilhosa oportunidade para acessarmos a riqueza, não apenas do mundo interno da criança, mas do nosso próprio mundo interno através desses recursos.

Nos adultos, a fantasia apresenta-se mais velada ou é bastante associada aos conteúdos sexuais. Porém, ela não se restringe a essa área da vida. E, uma coisa é certa, todo mundo fantasia o tempo todo sobre algo!

Fantasiar é como sonhar acordado, é possível criar e recriar uma cena mental quantas vezes forem necessárias, o propósito maior será sempre a satisfação de um desejo. Não existe a preocupação com a realidade, o que confere também uma sensação de liberdade, autonomia.

Ela cumpre um papel regulador importante também, pois não seria tão incrível assim, se pudéssemos sair por aí realizando tudo o que desejamos. Imaginem cenas como o revide ao chefe numa situação de discussão, a agressão a alguém que nos magoou, a vontade de matar quando levamos uma fechada no trânsito. Muitos transtornos e talvez alguns processos, atravessariam o nosso caminho, se o gênio da lâmpada realizasse todos os nossos desejos. Então, a fantasia surge como um importante vetor de escape. Sem ela seriamos animais agindo apenas por instinto, sem nos importar com as consequências na maioria das vezes.

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Partindo do princípio de que, sempre fantasiamos o que não temos e não somos, ou o que gostaríamos de ter e ser, existem situações que surgem no campo da fantasia, mas que a pessoa de certa forma consegue trazer para o seu mundo real, realizar de certa forma.

Alguns exemplos de quando isso ocorre são as feiras de games nas quais os participantes se fantasiam como os seus heróis em cosplays perfeitos; os adolescentes que se inspiram no estilo de algum ídolo; os covers das personalidades – que muitas vezes fazem disso a sua profissão; as famosas (e cada vez mais elaboradas) danças de noivo ou noiva nas cerimônias de casamento.

Recentemente teve grande repercussão um vídeo de uma noiva dançando a música da Beyoncé. Para mim fica muito claro que o desejo maior ali não era o de agradar ao noivo, mas o de ser a Diva Pop por alguns instantes, e a noiva conseguiu porque estava realmente deslumbrante.

Assim, é bonito, coerente e saudável usar desse recurso da fantasia.

Mas o cenário se inverte quando, como falei inicialmente, a pessoa dedica toda a sua energia a fantasiar e não constrói maneiras de ser feliz na sua vida real. Ela pode desenvolver sérios transtornos psíquicos e comportamentais.

Como por exemplo, as pessoas que arriscam a vida em procedimentos cirúrgicos para se tornem como as bonecas; as pessoas que nutrem um amor platônico e não conseguem amadurecer e se relacionarem com outras pessoas do mundo real, presa nesse estado ela pode criar o que quiser, não sofrerá, mas também não desfrutará do prazer da relação real a dois; os que constroem planos e ideias mirabolantes sobre a vida ou carreira, mas que derrapam sempre e não conseguem transformar isso em ações práticas no seu dia a dia; dentre outros exemplos.

Ao desejar algo, a pessoa já está se preparando para alcançar a tal situação/objeto, seu estado emocional muda, cria-se uma expectativa da ação para a realização do desejo gerador de prazer. Esse mecanismo todo é saudável e todo mundo deve experienciar.

No entanto, fantasia que aprisiona e deixa o indivíduo refém desse mecanismo de busca pelo prazer e realização apenas através do imaginário, é nociva, pois priva a pessoa da construção e experiências concretas que é onde de fato, a vida acontece.

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Fingir a Beyonce, realizar aquela fantasia sexual que vai melhorar a sua relação, vestir a roupa da Mulher Maravilha, é lúdico, é tudo de bom. Acreditar que a vida só terá sentido quando conseguir realizar todos os seus desejos e se encerrar nesse mundo paralelo é nocivo e carece de cuidados adequados.

Talvez você tenha se identificado com o lado mais obscuro do mecanismo de fantasiar, mas não se desespere, olhe com amorosidade, perdão e respeito para a sua história e acredite, sempre é possível uma transformação. O que não pode é se apaixonar ou tentar viver pelo irreal. E agora que você já dos benefícios que a fantasia pode proporcionar a sua vida, aproveita o Halloween e se joga!

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Marleide Rocha

Marleide Rocha

Marleide Rocha, psicóloga (CRP 95323), é especialista no tratamento da Obesidade, membro da Sociedade Brasileira de Coaching e da European Network for Positive Psychology e da APPAL - Associação de Psicologia Positiva da América Latina. Nossa colunista escreve aos sábados no Comethica. Acompanhe-a no www.marleiderochapsicologia.com.br.

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